TELEFONAR PARA MONTALVÃO OU DE MONTALVÃO ERA SEMPRE UMA INCÓGNITA.
Entre a Praça e a rua da Barca
Primeiro o Correio e depois o Correio e o Telefone. Consta (mas há que confirmar) que o primeiro telefone público (n.º 1) foi instalado em Montalvão, em 1906. O primeiro privado (n.º 2) em 1917.
O correio chegava e partia da Praça (da República, depois de 5 de outubro de 1910) instalando-se com o telefone num piso térreo na rua do Hospital (atual travessa da Praça) em casa do «Ti Deniz» depois à responsabilidade da filha Mariana de Matos Diniz. Seguiu-se, na rua da Costa, o piso térreo da casa da D. Amália Godinho Castanheiro Louro (Menina Amálha dos Corrêos) que habitava no piso superior e, finalmente, no edifício da Junta de Freguesia situado na rua da Barca.
Se as estradas foram o primeiro meio para diminuir o isolamento de um território que durante séculos foi uma "ilha rodeada de terra" encravada, a Este e Norte, entre dois rios - Tejo e Sever - praticamente intransponíveis durante parte do ano e a Sul entre duas ribeiras que pelo seu traçado dificultavam muito a circulação, a ribeira de Nisa (Sudoeste) e a ribeira de São João (Sudeste) restando uma nesga de terreno aplanado onde estava instalado o caminho milenar entre Castelo de Vide - Castelo Branco - Castelo de Vide pela Lomba da Barca onde se fazia a travessia do rio Tejo. A ligação a Nisa era tão complexa que até à construção da ponte na Estrada Nacional n.º 359 (que tem menos de cem anos embora os esteja a completar) a ponte sobre a ribeira de Nisa era na Senhora da Graça.
O serviço de correios chegou para quebrar esse isolamento.
Em 24 de abril de 1758, o Vigário Frei que descreve o território montalvanense a pedido da Corte, em Lisboa, também para avaliar os danos provocados, em todo o território de Portugal, pelo terramoto de 1 de novembro de 1755 é perentório.
Para a pergunta:
«Se tem Correio, e em que dias da semana chega e parte? e se o não tem, de que correio se serve, e quanto dista a terra aonde elle chega??»
Respondeu:
«20 - Naõ tem correyo, porque o correyo de que se serve esta Villa hé o da cidade de Portalegre; que dista seis légoas, que parte nas quintas feyras e chega no sabbado.»
Depois houve os habituais progressos, lentos, mas efetivos.
Seguiu-se a instalação do telégrafo e telefone. A história de onde esteve primeiro, ficou depois e está agora fica para outro texto.
De Montalvão era "dar à manivela" tocava em Nisa, esta solicitava Portalegre que pedia o número de telefone de Lisboa, com seis dígitos (algarismos), depois sete e agora nove acrescentando 21 ao seu início. Quando o 21 chegou já não havia manivelas para dar. Todo o País estava dotado de rede automática. As páginas de algumas das Listas Telefónicas:
1932
1942
1960/61
1970/71
Até 1971/72 quem telefonasse de uma rede automática para Montalvão teria de utilizar o indicativo 09, ou seja, o serviço manual. Discava o 09 para a rua Andrade Corvo, em Lisboa e depois de pedir o número que queria contactar em Montalvão lá ia ouvindo fazer o pedido para Portalegre e depois Nisa. De Montalvão para uma rede automática era o inverso. Manivela. Depois pedir o número da rede automática com seis dígitos.
Depois de 1972/73 a área abrangida pela rede de Portalegre recebeu um indicativo próprio, o 0045.
Depois, em 1975/76, reduzido a 045.
1980/81
Mas até 1988/89 o serviço telefónico estava limitado pelo horário do serviço manual em Nisa, ou seja, o horário da estação de correios. Montalvão mantinha telefones apenas numerados pela ordem cronológica da instalação.
Até há cerca de 30 anos só se conseguia telefonar para e de Montalvão, entre as 09:00 e as 12:30 horas. Fechava para almoço. Depois entre as 14:00 e as 18:00 horas. Fechava até à manhã seguinte. De segunda-feira a sexta-feira.
1990/91
Enquanto os números telefónicos das redes no litoral, por serem mais numerosos passam a sete dígitos, em Montalvão passam a cinco, com os três primeiros 431 a juntarem-se aos dois já existentes.
2000/01
Com o sistema digital fixo (com o 2) e o móvel (com o 9), Montalvão passa a ter nove dígitos como em todo o território, com os números 2457 a juntarem-se aos cinco já existente. E assim ficou...
UM LUGAREJO DE MONTALVÃO QUE CHEGOU A TER 27 CASAS E 67 PESSOAS EM HABITAÇÃO PERMANENTE.
Em meados dos Anos 50 começou a ficar despovoado até perder o último habitante temporário nos Anos 60 e definitivo nos Anos 70.
Seguiu-se o abandono.
O lugarejo mais Setentrional do Além-Tejo
Mas chegou a ser a localidade, ainda que um lugarejo (Monte) mais a norte do Norte Alentejano, com nascimentos e mortes registadas e certificadas. A última localidade antes de atravessar o rio Tejo para Norte ou a primeira depois de atravessar o grande rio peninsular de Norte para Sul.
Em 1758: 13 edifícios e cinquenta pessoas
Na descrição (arquivada na Torre do Tombo, em Lisboa) que Vigário Frei António Nunes Pestana de Mendonça faz, em 24 de abril de 1758, a pedido do Poder Central, em Lisboa, para avaliar os estragos provocados pelo terramoto em 1 de novembro de 1755 (original e tradução) à pergunta:
«6. Se o tem, que Lugares, ou Aldeas, comprehende, como se chamaõ, e que visinhos tem?»
De Montalvão responde: «= Tem e comprehende em si esta freguesia, cinco lugares a que vulgarmente se chama Montes = a saber Monte do Pombo que tem trese fógos e trinta e três pessoas de comunhão; dezassete pessoas menores. -»
Ocupação humana e agrária compreensível e justificada
Era um local fundamental para poder usufruir de condições geomorfológicas superiores às da maior parte do território. Condições - arcoses e cascalheiras - muito semelhantes às que permitiram estabelecer ocupação humana e crescimento populacional na Salavessa. Estas condições justificavam, em grande parte, a sua existência e localização.
A localidade de Montalvão como sede de concelho e depois de freguesia ficou sempre muito periférica em relação ao centro geográfico do território que tem sob sua "jurisdição". Caminho Castelo de Vide para Castelo Branco e vice-versa O Monte do Pombo não ficava em pleno caminho milenar que ligava Castelo de Vide a Castelo Branco ou este a Castelo de Vide mas ficava numa encosta para Nordeste, com muita e boa água, já muito próximo da Lomba da Barca, onde se fazia a travessia do rio Tejo. A uma légua de Montalvão, concretamente 4.8 quilómetros e a 1,1 quilómetros da margem esquerda do rio Tejo.
O Ti Mané Corrêa Foi o grande proprietário dos terrenos ao redor do Monte do Pombo. Os habitantes deste lugarejo faziam muitos trabalhos sazonais para ele, tal como para o Laia (dono da herdade Lomba da Barca) e com origem num povoado da Beira Baixa. Muitos habitantes do Monte do Pombo viviam das suas hortas - o lugarejo era generoso em água permitindo hortas junto das linhas de água - vendendo em Montalvão. Além disso alguns habitantes de Montalvão tinham olivais, com alguns sobreiros e pinheiros mansos, nos cabeços de arcoses e cascalheiras pois estas permitiam que, também, a cobertura vegetal fosse generosa. Uma "saca de azeitona" do Monte Pombo dava um alqueire de azeite. Eram consideradas das melhores oliveiras do território montalvanense. Até ao apanhar (ripar) azeitona ficavam as mãos logo untadas, enquanto noutros locais a azeitona era mais «abrufêra» (água russa) que «azête». Escrever acerca do Monte do Pombo nunca se pode olvidar os antepassados do Ti Mané Corrêa e dos seus descendentes. Provavelmente foram dos primeiros a chegar e de certeza, os últimos, a abandonar o lugarejo.
O GRANDE ATLETA MONTALVANENSE COMPLETA 76 ANOS, NESTE DIA 7 DE NOVEMBRO DE 2020.
Declaração de interesses: vi Morujo Júlio correr mais de duas dezenas de vezes, ao vivo e a cores, no corta-mato (campeonatos regionais, nacionais e "Corta-mato dos Dez"), em estrada (Estafeta Cascais - Lisboa) e nas pistas (campeonatos regionais e nacionais, além de outras competições). Vi-o no Vale do Jamor e noutros terrenos acidentados nos arredores de Lisboa (do Campo Grande aos terrenos junto ao estádio da Luz), na Marginal, particularmente em Paço d'Arcos e em muitas pistas: estádio Nacional, José Alvalade, estádio Universitário, Restelo e FNAT/Inatel (atual 1.º de Maio). Penso que nunca o vi correr na pista sintética do SL Benfica. Nunca o vi correr em pista coberta (pavilhão do estádio universitário). Não fui ver as competições para o ver. Fui ver as competições para ver o Benfica vencer. Infelizmente celebrei poucas vitórias do Benfica frente à fortíssima equipa do SCP. "Torcia" pelo Benfica frente a ele, mas...torcia por ele (por ser de Montalvão) frente aos seus colegas de clube: Carlos Lopes e Fernando Mamede. Repito. Vi-o correr mais de duas dezenas de vezes, por vezes passar a um palmo de onde estava nas competições de corta-mato e estrada.
NOTA INICIAL: Esperemos que em 2024, aquando dos seus 80 anos, os blogues tenham maior capacidade que atualmente... Já colocar "tanto peso" em digitalizações foi como correr uns quantos quilómetros! Estatísticas e informações retiradas do portal do jornalista Manuel Arons de Carvalho (clicar).
É muito complexo fazer corresponder na atualidade os edifícios ao que eram há 60/80 anos pois neste caso, um prédio (o n.º 46) resultou da aglutinação de duas casas, onde ele nasceu mais à esquerda (depois da Xá Quetéra) e outro mais à direita da Xá Rosalina. Eram casas de um piso, muito diferentes da atual, em altura, largura e fisionomia (sem varanda)
Em 7 de Novembro de 1944 (terça-feira) nasceu na rua da Barca, José Morujo Júlio, filho único. Deixou Montalvão aos seis meses de idade, vivendo em Lisboa até aos seis anos. Regressou com os pais a Montalvão, onde entre os seis e os dez anos fez a instrução primária na «Escola Nova» e o exame da 4.ª classe como habitualmente em Nisa. Filho de pai Benfiquista cedo revelou inclinação para o Sporting Clube de Portugal. Em Montalvão não revelou especial aptidão para as corridas, embora fosse imbatível no jogo da "barra do lenço", em Montalvão denominado "Tirar a Bandeira», jogado muitas vezes no Adro. Era temível.
HOUVE DEZENAS DE "CURADORES DE MALEITAS" EM SETE SÉCULOS MONTALVANENSES.
No auge demográfico e social de Montalvão no século XX (Anos 40 e 50), houve o Senhô Zé Barbêre.
Com barbearia na rua do Outeiro junto à Praça (da República, depois de 5 de outubro de 1910) o Senhô Zé Barbêre era o "Ai! Valha-me Deus" para a população da freguesia de Montalvão que chegou a estar próxima de três mil pessoas, em meados dos Anos 50 (2 649 no Recenseamento Geral da População de 1950 mas continuou a aumentar ainda mais uns anos para ser de 2 264 no "Censo de 1960"). (clicar em cima desta e de quase todas as imagens permite melhor visualização das mesmas)
Quando as pessoas tinham uma dor de dentes lá iam em correria pedir, por favor tire-me este desconforto, ao Senhô Zé Barbêre.
Quando se torcia alguma perna ou braço era ao Senhô Zé Barbêre, que alguém ou alguns, pegavam no sofredor e entregavam-no mazelado em casa dele. Esperavam e eis que viam regressar um outro ser como que ressuscitado do sofrimento.
Quando se tinha um dor de barriga era ir a correr ao Senhô Zé Barbêre, o mais breve possível, para estar em conforto, o mais tempo possível.
Quando se tinha uma dor de cabeça, com permanência ou frequentemente, só havia uma solução. As "mézinhas" do Senhô Zé Barbêre faziam "milagres" em pouco tempo.
Quando se partia algum osso, eram as talas que tinha, e o modo como as colocava, com ligaduras bem compostas e mãos ágeis e habilidosas que permitiam ao enfermo ter confiança na recuperação rápida e sem mazelas para o futuro.
Quando havia feridas com gravidade, que não podiam ser curadas a esfregar a pele arrepiada, pois mostravam carne exposta e tendões a desfiar, era o Senhô Zé Barbêre que sabia o que fazer e como fazer. Quem estava ferido acreditava que depois de passar por ele deixara de estar ferido ou tão ferido...
Numa população com quase três mil pessoas, tão isolada, havia sempre alguém a quem era necessário recorrer pois não havia médicos, enfermeiros ou farmacêuticos. O Senhô Zé Barbêre não era nada disto e era tudo. Para servir todos. Os montalvanenses expiavam nele as dores do corpo e, por vezes, até as da mente. Ele sabia conversar e era convincente. Dava a tranquilidade que se desejava e procurava.
Indicar com precisão algumas das habitações com 60/80 anos de diferença é tarefa muitas vezes impossível pois, entretanto, houve edifícios vizinhos que se aglutinaram para deles resultar um como também houve o processo contrário, ou seja, edifícios que foram divididos por motivos vários, entre eles processos de "partilhas" (heranças).
A barbearia/curadoria era a "primeira casa baixa" à esquerda, na atualidade estão duas casas aglutinadas, a dele e a do vizinho debaixo, com barra ocre.
Era de trato fino, palavras meigas e certeiras que davam descanso, ajeitavam a alma intranquila e curavam emoções descontroladas.
Foi um sobrinho dele, casado para a Salavessa, que herdou o seu jeito, curiosidade, confiança e sabedoria. Montalvão passou a ir à Salavessa.
Problemas emocionais mais graves era no confessionário perante o Senhô Padre.
Eis um montalvanense pelo qual havia tanta estima, consideração, confiança, apego, reconhecimento e apreço que sendo do Povo (e popular) era como se fosse dos «Riques», em montalvanês, o nome dos Lavradores-Proprietários. Era Senhor e não era Ti. Senhor José Barbeiro, o mui nobre e leal para os montalvanenses, Senhô Zé Barbêre.
Com o território pacificado mas pouco povoado as Ordens Militares vão perdendo importância. No território, outrora da Açafa, doado em 5 de julho de 1199, os Templários conseguiram êxito total na expulsão dos almóadas e pacificação levando a "fronteira cristã/muçulmana" para um limite cada vez mais meridional. Mas não tiveram o mesmo sucesso no povoamento pois até Nisa, fundada em 1232, não era muito povoada face às expectativas de poder ser um polo difusor de povoamento numa vasta área, mesmo com a ideia mítica que teria sido fundada com a ajuda de antigos habitantes de Nice (França) daí a semelhança entre os dois topónimos.
Os Templários com a sua mestria e desempenho conseguiram mesmo fazer aumentar o território que lhes foi doado em 1199 pois dele não constavam Alpalhão e Arez que estão a sul da ribeira de Figueiró e desta para ao "esporão rochoso" da Melriça junto a Castelo de Vide.
Depois do domínio das Ordens Militares chegava o tempo das Dioceses tomarem para si a responsabilidade de administrar e povoar o território vasto mas sem capacidade de atrair pessoas de outras áreas ou permitir que o crescimento demográfico fosse sustentável face às características climáticas, geomorfológicas e de organização agrária do Além-Tejo. A estabilidade na organização dos Bispados era muito superior à da Ordem dos Templários. Entre 1240 e 1255, houve cinco Mestres da Ordem dos Templários (há investigadores/divulgadores que indicam seis), mas dois Bispos da Guarda e um Bispo de Évora. Mesmo até à extinção dos Templários a renovação da liderança nestes e a estabilidade dos dois Bispados é por de mais evidente. Não explica tudo, mas clarifica muito.
Depois da reivindicação do território pelo Bispo da Guarda, em 1242, com recusa dos Templários e consequente excomunhão (clicar), seguindo-se a necessidade de proteção pedida ao Bispo de Évora, em 1250 (clicar) adivinhava-se uma luta de poder pela posse do território que restava aos Templários na «Herdade da Açafa», entre o Bispado da Guarda e o de Évora. E eis que chegaria em 1260 como mais tarde, aqui neste blogue, num Futuro próximo, talvez já em Novembro deste ano de 2020, será divulgado todo o vasto acordo entre os dois Bispados, em latim e a respetiva tradução em português contemporâneo. A seguir publica-se um excerto (dez por cento do texto do acordo) e a divisão territorial.
Antes recordemos parte do texto da ata feita na cidade de Tomar, em abril 1250, em latim e a tradução:
E um pequeno excerto do vasto texto escrito em 22 de março de 1260, em latim e a divisão territorial acordada (esta ainda não é a tradução literal a partir do Latim):
Afinal a estratégia de abril de 1250 - fazer acordo com o Bispo de Évora perante a pressão da Diocese da Guarda - não durou mais que uma década. Em 22 de março de 1260, os dois Bispados preferiram resolver entre eles os limites entre as suas Dioceses à revelia da Ordem do Templo retalhando o território ainda ocupado pelos Templários. Os pormenores ficam para mais tarde, divulgados aqui no blogue, como já ficou atrás escrito.
Para trás (Passado) ficaram registadas as ações de abnegação, mestria e coragem dos míticos Cavaleiros da Ordem do Templo de Salomão. No Futuro (para nós e vindouros) está espelhado muito do que eles foram, fizeram com tanto apego e valor que ficará deles para todo o sempre uma imagem como esta:
O território templário a sul do rio Tejo ia resistindo. Em 1260 nova tormenta chegaria...
EM MONTALVÃO AS CERIMÓNIAS MAIS POPULARES SEMPRE FORAM ACOMPANHADAS DE MÚSICA.
Mas como por todo o Alto Alentejo não se pode dizer que a música popular seja "exuberante" como noutras regiões do País, embora os dois grandes estudiosos da música popular portuguesa, com recolhas efetuadas por todo o Portugal, Michel Giacometti (nascido na Córsega/França) e Fernando Lopes Graça afirmassem que cada região tinha as suas formas musicais de acordo com, as características das respetivas ruralidades, a nível da relação empregador/jornaleiro e do tipo de técnicas agrícolas empregues na generalidade das tarefas agrícolas.
O Alto Alentejo fica entre duas regiões com características diferenciadas, onde dominam formas de expressão musical bem definidas e distintas: a Beira Baixa com adufes e variações rítmicas consideradas das mais diversificadas de Portugal e o Baixo Alentejo com o "Cante" polifónico com grande amplitude e enorme variedade de letras que está reconhecido, devida e inequivocamente, como «Património Imaterial da Humanidade» pela UNESCO.
No Alto Alentejo, a música popular mais divulgada e consistente é a «Moda das Saias» ou simplesmente «Saias» uma forma musical simples e cantada por isso podem ser só cantadas ou podem ser bailadas. O ritmo é binário composto (6/8) com pandeireta, no século XVII (1601 a 1700), também adufe mais tarde com concertina. Até castanholas podem ser usadas por quem dança e canta, o que também liga a «Moda das Saias» à música/dança do sul de Espanha.
O que é a «Moda de Saias» do norte alentejano é a grande pergunta que se deve fazer, até porque não há uma resposta exata a essa dúvida. Pode ser um tipo de canção regional portuguesa, isto é, um capitulo do nosso cancioneiro tradicional, pode ser uma dança tradicional, pode ser uma forma de canto, e pode ser tudo isto ao mesmo tempo.
Giacometti e Lopes Graça, que, no passado século, recolheram parte destas cantigas de campo, ligaram a Moda de Saias aos despiques que aconteciam nos trabalhos agrícolas, nomeadamente por altura das colheitas, dizendo que estes podiam, ou não, ser bailados, e acrescentaram que estes cantarolares também poderiam acontecer em momentos de descontração e festa. Estes mesmos estudiosos da música popular portuguesa apontam Espanha como a influência principal das «Saias» alentejanas – tendo em conta a proximidade da raia, não parece de todo improvável. Há aqui uma distinção a fazer nesta influência espanhola: uns dizem que poderá vir da Saeta, dança religiosa do folclore do sul de Espanha; outros que virá de tradições do sul de Espanha, mas de cariz profano e não religioso, aproximando-a do bailado sevilhano. Parece, até pelo carácter lúdico do cantar das «Saias», que a segunda hipótese é mais plausível.
A estrutura dos versos da «Moda das Saias» é muito simples e pode ser adaptada a cada localidade, como estes versos:
Todos
Adeus Montalvão branquinho Não és vila nem cidade, Mas és um rico cantinho Onde mora a mocidade.
Homem
Menina que tanto sabe, Diga lá o seu saber, Uma camisa bem feita Quantos pontos vem a ter.
Mulher
Quantos pontos vem a ter Vou-lhe já explicar, Nem é mais e nem é menos Dos que lhe querem prantar.
Homem
Estas raparigas finas de hoje Iguais às de ontem no monte, Albardá-las e mandá-las Com um cântaro à fonte.
Mulher
Estes rapazes de agora Estes que de agora são, Albardá-los e mandá-los à serra buscar carvão.
Homem
Canta lá ó prima, ó prima Canta prima tu mais eu, Canta lá ao teu amor Que ó prima eu canto ao meu.
Mulher
Anda cá meu preto moreno Torradinho ao sol de agosto, Quanto mais moreno mais fino Quanto mais fino mais gosto
Homem
Menina que tanto sabe Faça-me esta conta bem, Um moio de trigo limpo Quantas meias quartas tem?
Mulher
Falaste no trigo limpo Mas não me falas no joio Quatrocentas e oitenta Meias quartas tem o moio.
Todos
As ondas do teu cabelo Nelas me deito a afogar, É pra que saibas amor, Que há ondas sem ser no mar.
Em Montalvão, a concertina, em meados do século XX (1901 a 2000) era o instrumento que não podia faltar em casamentos e bailes, no Salão da Xá Cezíla-a-Zabumba (rua da Barca) ou da Xá Gracinda (rua do Arneiro).
Salão de Baile As duas tabernas com salão de baile eram sumptuosas. Nos dias de festa engalanavam-se com artistas tocadores. Eram concertinas, banjos, música e tudo a dançar. O Salão de Baile da Xá Gracinda era afamado. Música de fora, até vinham tocadores, dizia-se, lá dos lados de Lisboa, para abrilhantarem, até às tantas, as danças de pares, entre as montalvanenses e os montalvanenses. Nem se cabia e se o salão era grande.
Até com apenas uma harmónica (gaita-de-beiços) se fizeram bailes nos anos 50!
Montalvão tinha sempre algum tocador de concertina. Havia música (e baile) pouco depois do «Entrudo», o "Baile da Sardinha» em que no final se fazia cair no salão, doces e enfeites, pendurados durante o baile no teto do salão. Havia música (e bailes) a abrilhantar e dar alegria aos casamentos, durante dois ou três dias, muitas vezes com tocadores que vinham "de fora" como, por exemplo, de Nisa. Havia música pela «Festa da Senhô Dumédes» (8 de setembro) quase sempre três dias, na Corredoura, antes ou depois - dependia do calendário de cada ano - do dia de Nossa Senhora dos Remédios.
Mas havia música num qualquer domingo em que os «quintes» em ano de "Sortes" (Inspeção Militar) decidissem que tinha de haver alegria a percorrer as ruas da povoação. Vai de se juntarem e correrem os arruamentos de concertina e a cantarolar, em grupo a tentar ocupar a largura das ruas.
Os «quintes» eram os grandes animadores musicais em Montalvão para lá dos bailes aprazados e das Festas de setembro.
Depois com a inauguração das instalações definitivas da Casa do Povo, em 10 de setembro de 1952, os bailes (e a música) passaram para o grande salão que está no seu interior.
E escrevendo acerca da música em Montalvão nunca se pode ignorar a Banda Filarmónica, bem como as contradanças do rancho folclórico. A Banda Filarmónica (musseca, em «montalvanês» que existiu durante quase uma década, atuando aquando em grandes eventos que ocorrerem na povoação ou nas alvoradas dos dias da "Festa da Senhora" bem como na Praça de Touros (Corridas à Vara Larga) e, até num qualquer domingo de manhã, percorrendo as ruas de Montalvão terminando a atuação na Praça da República, convidada para abrilhantar festas para lá da povoação, em Arez até em localidades no concelho de Castelo Branco - Perais e Benquerenças - mesmo de Vila Velha de Rodão, como Perdigão (Fratel).
As Contradanças com atuações mais episódicas, ao som da concertina, mas também para lá dos limites do povoado, em Nisa, Portalegre e Elvas, pelo menos.
Dois textos de José Alberto Sardinha, publicados em 1982, um dos investigadores que melhor soube continuar o trabalho dos seus mestres (Michel Giacometti e Lopes Graça) acerca da Beira Baixa e do Alentejo. Depois uma tema musical onde se percebe como se conseguem "colar" várias "Saias" numa série infindável de letras ilustrando como é um tema simples mas que pode ser bailado até "ser dia".
Assim, também, se fez Montalvão.
NOTA: Há ainda o Grupo Coral "EmCanto" mas escrever acerca dele e de Montalvão contemporâneo está aprazado para quando forem publicados os dados demográficos e habitacionais do Recenseamento Geral da População a realizar em 2021.