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01 julho 2022

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Rio Sever 1803

01 julho 2022 2 Comentários

HÁ DOIS SÉCULOS MONTALVÃO FICOU "RETRATADO" A TINTA EM PAPEL PARA A POSTERIDADE.

 

O rio Tejo à esquerda com o rio Sever a surgir pela direita, como que envergonhado. À esquerda: Beira Baixa; ao centro, a localidade de Cedilho/Casalinho; à direita, o território montalvanense

Descrito com critério por quem não habitava em Montalvão. É pois um olhar "de fora para dentro" de alguém que era perito em interessar-se pelos pormenores que realmente deviam ser valorizados.



Em 1758, há uma excelente descrição do território feito por Vigário Frei António Nunes Pestana de Mendonça a pedido do futuro Marquês de Pombal que solicitou aos párocos de todo o País a descrição das suas paróquias. Comparando a descrição de Montalvão com as outras paróquias podemos estar grato ao nosso vigário que se esmerou. Colocado pela Diocese de Portalegre, em Montalvão, com conhecimento do local onde vivia pode fazer um trabalho de grande qualidade que permite conhecer (bem...) o território de Montalvão em meados do século XVIII.



Quase meio século depois, em 1803, há outra descrição, desta vez por um "estranho" que estudava as características da fronteira do Nordeste Alentejano. São 28 páginas manuscritas (mais 27 e um pouco da 28.ª!) essencialmente do ponto de vista militar mas que foram muito para além disso, ainda que seja esse o objetivo. Mas permitiu saber a geografia física e humana, bem como a arquitetura, demografia, rede viária interna e externa, vida dos montalvanenses e a sua capacidade de sobreviver, bem como o modo como o faziam. Aborda-se neste texto as descrições mais detalhadas acerca das pessoas, deixando-se para outros, o clima, a vegetação, a geologia, os cursos de água (dois rios e cinco ribeiras/ribeiros) e a descrição da vasta rede de caminhos - para veículos (carrilhos) e para pessoas (veredas e carreiros) - com as distâncias reais e tempo gasto, para chegar a localidades como Castelo de Vide, Marvão, Portalegre, Alpalhão, Nisa, Castelo Branco e Ferreira de Alcântara (Espanha). Além das localidades intermédias, como é evidente. 



Foi o então Oficial do Real Corpo de Engenheiros, José Maria das Neves Costa, nascido em Carnide (atualmente pertencente a Lisboa) que fez um reconhecimento militar da fronteira do Nordeste Alentejano. Deixou um conjunto de memórias descritivas e uma carta topográfica pormenorizada que mesmo sendo trabalhos para o exército (Inspeção Geral das Fronteiras e Costas Marítimas do Reino) e interesse militar documentam com preciosidade e minucia o que eram e por onde se deslocavam os montalvanenses. 

 


O Rio Sever por ser tão importante na organização e definição do território teve grande destaque. Em Montalvão nem era o rio Sever... era o"O RIO". Como se só houvesse um, mas depois havia vários, tantos quantos os moinhos de rio - o do Moinho Branco, da Nogueira, do Artur,.... Só havia um rio e dentro deste vários rios conforme os açudes para juntar água (pégos) para fazer jorrar com força essa água para movimentar as mós e transformar o grão de cereal em pó (farinha). O RIO era fundamental para a existência e sobrevivência de Montalvão. Há que ilustrar o que dele foi dito no início do século XIX e depois mostrar o que foi e é em termos geográficos.


A - nascente na serra de São Mamede; B - nascente na serra Fria; C - onde começa rigorosamente o rio Sever (confluência das duas barrocas); D - "Olhos de Água" (nascente mais forte do rio com a água a brotar do solo devido ao nível freático estar muito próximo da superfície; 1 - Ponte Velha; 2 - Ponte da Portagem; 3 - rio Sever a fazer fronteira entre Portugal e Espanha; 4 - entrada no concelho (depois freguesia) de Montalvão; 5 - Foz do rio Sever na confluência com o rio Tejo


Características

O rio formou o seu leito e modelou a sua bacia hidrográfica durante milhões de anos. O clima foi variando mas no último milénio poucas alterações existiram. No entando há um rio antes e um rio depois da construção, mas principalmente, enchimento (1975) da albufeira artificial provocada pela barragem de Cedilho na confluência da foz do rio Sever com o rio Tejo, para aproveitar as sub-bacias do rio Sever e Pônsul na bacia hidrográfica do segundo maior rio da Península Ibérica. A sub-bacia do rio Sever tem 328 quilómetros quadrados (187 em Espanha; cerca de 60 por cento) e uma extensão de 63 quilómetros se bem que o rio Sever tenha dupla origem (duas ribeiras que se unem) um caso idêntico ao rio Danúbio. O rio Sever ou "O RIO" (em "montalvanês") é estruturante para todo o território montalvanense, muito mais que o rio Tejo, pois a localização de Montalvão tem mais relação - economia (peixe e moagem de cereal), subsistência (água) e estrutura agrária (humidade) - com o Sever que com o rio Tejo. A Salavessa é a localidade do rio Tejo, enquanto Montalvão é a do rio Sever.




A descrição do "RIO" em 1800 com publicação em 1803

A montante o rio Sever não tem alteração. Quem já o percorreu reconhece nesta descrição com 220 anos de diferença só semelhanças. O rio ainda é assim. A exceção são as azenhas - de moagem - que há muito estão abandonadas.



Como o estudo foi no âmbito militar a preocupação era com os locais onde e como se podia atravessar. Havia duas pontes, a Velha (derrubada nos Anos 30) e a "Nova" ainda existente na "Portagem". Pontes muito antigas e utilizadas pois era o ponto de atravessamento do rio na estrada romana entre Lisboa e Mérida, que ainda tinha ligação para norte de Mérida com a gigantesca - sabe-se que era a maior ponte do Mundo, em pedra - na localidade de Alcântara, que em árabe quer dizer "A Ponte".




A Ponte Velha, talvez na única fotografia que existe a provar a sua existência. A sua exiguidade obrigou os Romanos a fazerem uma outra ponte mais a montante do rio, que deu origem à Portagem, pois o atravessamento era pago, tal como em Alcântara.




A descrição continua e quem fizer o percurso tem as mesmas características físicas embora esteja tudo, praticamente, sem vivalma ou idosos encerrados em Lares.



O rio segue dividindo o concelho de Castelo de Vide e de Marvão e depois de Marvão por Castelo de Vide já na freguesia de Póvoa e Meadas, com Santa Maria da Devesa, a Sul. Como todos os montalvanenses sabem os "povatches" apesar de ficarem mais próximos de Montalvão que Nisa, pertencem ao concelho de Castelo de Vide. E estão lá muito bem! 





Eis o que mais interessa

A entrada do rio Sever na freguesia de Montalvão, na foz da ribeira de São João com confluência no rio Sever. A partir daqui estamos em "casa". Açude de Bomcem e as areias do(s) Moinho(s) Branco num meandro incrível do rio Sever que fazia as delícias dos «catchepínhes» quando os havia em Montalvão. Na foz da ribeira de São João - mais do lado de Espanha, há mais de cem gravuras rupestres gravadas nos "cantches" do leito (que só entre as primeiras e últimas chuvas do ano está coberto de água). O Moinho Branco era o primeiro a trabalhar mas também era o primeiro a parar. Depois é a sequência conhecida de açudes, pégos e moinhos: Lopes (depois do Ica), Nogueira, Artur (bom para ir à loja do Fabián), Mendes (depois Damenes), Tchá Tourêra (mais uma boa vereda para Casalinho), Ti Júan Batista, Marí Neta (outra vereda para Cedilho) e Ti Mané Pedro (último a iniciar a moagem, mas também o último a deixar de o fazer). Há registos de mais moinhos, em 1758, mas foram-nos transformado em palheiros, em final do século XVIII.




Os moinhos ou azenhas de rio duraram até que foi instalada a energia elétrica em Montalvão, ou seja, até 1948. Depois foram sendo desativados, pois era um trabalho colossal levar grão e trazer farinha por caminhos onde devem ter ocorrido algumas desgraças, tal a inclinação das vertentes. Havia confluência de barrocas no rio Sever onde o Ser Humano nunca deve ter estado. Natureza e drama entre animais selvagens no estado puro.



A preocupação, na descrição, era onde se conseguia atravessar e que grau de dificuldade tinham esses atravessamentos no rio Sever.



Em arquivos nacionais encontram-se algumas imagens registadas pelo «povatche adotado montalvanense», João Pedro Martins Barata.




Outra:




Mais uma:




E ainda outra:




Durante anos, no dia 13 de maio, era uma festa o transporte de Nossa Senhora de Fátima (co-padroeira com Santo António) de Casalinho/Cedilho, entre as duas margens do rio Sever, de Casalinho para a foz e da foz de regresso a Casalinho.




O rio Tejo ao centro com o rio Sever a surgir pela esquerda. À direita: Beira Baixa; ao centro Cedilho/Casalinho; à esquerda, o território montalvanense

Continua um dia destes...

2 comentários blogger
  1. Continua?
    Depois de ler (vou ler de novo) estava convencido que o Professor ia de férias e deu a matéria toda!!!
    Cá estarei atento para a continuação da aula. Montalvão tem na realidade muito que se lhe diga.
    Apesar de ser povo pequeno é grande na História, pois é lá que está sepultado o último Grão-Mestre Templário.
    Já passei por todos esses lugares. A Ribeira de Niza, encontro-a em vários lugares. O Sever na Portagem é uma beleza!
    Quando o Professor falou em 1803, pensei também que ia falar da guerra das laranjas, onde perdemos Olivença.

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    1. Caro Genealogista. Continua... recuando para 1758 pois o pároco local indica com precisão a importância do rio Sever. Portanto um recuo estratégico à Roger Schmidt. Lá chegaremos à Guerra das Laranjas pois Montalvão esteve envolvido. Saudações.

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