O Carnaval montalvanense era variado, diversificado e avariado. Para trás já muito ficou, vamos ao que falta do que resta. Em 2025, será a 4 de março.
1. Entrudo mascarado
As mascarédas começavam em finais de Janeiro e tinham o seu auge no dia de Carnaval. Quase sempre, a coberto do anonimato que uma máscara consente, aproveitava-se o Entrudo para criticar determinada pessoa, situação, acontecimento ou apenas mascarar-se por divertimento e eram terceiros a ver subtileza em algo que não passava de inocência.
2. Entrudo crítico
Com a cara mascarada ou escondida nas vestes e vestidos a propósito, havia quem procurasse imitar o modo de vestir, deslocar-se ou os tiques e atitudes de tal pessoa ou tal situação. Exagerava-se no gesto e na postura resultando uma caricatura. Evidenciava-se o lado ridículo e censurável, nem sempre com a prudência necessária, ultrapassando, por vezes, os limites do razoável. Como era Carnaval ninguém podia levar a mal, mas não quer dizer que ficasse esquecido. Em Montalvão o que era feito no Entrudo não ficava no Entrudo. Numa aldeia grande, mas mesmo assim pequeno agregado populacional muito concentrado, com casas exíguas, todos se conheciam - até pela sombra que deixavam ao Sol - por isso, todos dependiam uns dos outros, mesmo que pensassem que não. Mas nada impedia que, a coberto do anonimato, se criticasse o que não se tinha gostado desde o último Entrudo ou Entrudos. Com o declínio populacional depois da década de 40 tudo se aligeirou. Antes da iluminação elétrica as pessoas chocavam umas com as outras. No Entrudo tudo eram sombras. Mas quem se sentia criticado ou quem recebesse informação por intriga muitas vezes tomava por outros o que era feito por alguém! Mas havia sempre dúvida. E essa dúvida protegia os audazes. a chegada da iluminação pública trouxe também o início da debandada nos anos 50, 60 e assim sucessivamente. As pessoas passaram a viver mais "espaçadas" e o envelhecimento foi tomando conta da aldeia. O Carnaval deixou de ser o que era e passou a ser aligeirado.
3. Entrudo brincalhão
Mas a maior parte dos foliões queriam era passar o tempo. Vestiam-se de velhos (o mais usual), de ciganos, de tudo um pouco, o que a imaginação conseguia e possibilitava, alguns de cara destapada ou tapada mas de modo a ser fácil identificar, para percorrerem as ruas e desfrutarem dos comentários, elogiosos ou verrinosos, à sua passagem. Queriam era aproveitar o dia para se divertirem.
4. Aqui o escriba nunca gostou muito do Entrudo
Mas lembra-se de, com cerca de 13/14 anos, se ter mascarado - entenda-se vestido de luto com xailes e lenços pretos - curvando-se, apoiado numa velha bengala e ter ido ouvindo, pelo Arrabalde acima até ao São Pedro, que era a velha tal (perdeu-se no tempo da memória o nome da tal "ilustre" montalvanense) ou que era uma miúda («catchópa», em montalvanês) que queria imitar a tal "velhinha". Ora, aquando do disfarce nunca este escriba pensou em tal pois nem sequer sabia quem era ainda que certamente a conhecesse, mas não pelo nome e não quis, de modo algum, mascarar-se para imitar alguém. Simplesmente "pegou" na roupa da avó e cá vai disto! E encurvou-se para não ser reconhecido, não por querer parecer a Tchá ... !
5. Entrudo dançado
Nalgumas casas mais abastadas com salões e outras condições, como a de alguns lavradores («riques», em montalvanês) havia bailes noturnos. Não todos os dias ou todos os dias mas em casas diferentes. Não se misturando com os foliões de rua os «ricos» reservavam-se para a dança. Chegavam de máscara - como era hábito em algumas cidades europeias, mantendo-se em Veneza - que retiravam para espanto dos restantes que nem sempre adivinhavam quem era. Eram uns bailes de «ricos» à pobre como era norma em Montalvão. O acompanhamento musical era rudimentar - uma "gaita-de-beiços" (harmónica vocal) - mas por vezes nem isso. Dançava-se ao som de um adufe que a rapariga mais afinada se encarregava de vocalizar umas melodias alegres próprias do Carnaval que a seguir chegava o tempo do recolhimento e tristeza, a "Quaresma".
A preparação destes bailes começava muito antes com os «criados dos ricos» a confecionarem iguarias com base em carnes frias (essencialmente enchidos e mesmo algum animal de pequeno porte - cabra ou ovelha - embora fosse raridade) e doces tradicionais. Isto para os convivas irem petiscando durante a noite e madrugada entre as danças. Mesmo assim com acompanhamento musical tão rudimentar, o mito é que se dançava até de madrugada "polcas, mazurcas, valsas e chotices". Como poucos viram, de facto, mas muitos ouviram dizer (mais pela "criadagem"), talvez tudo não passe de lenda.
E a seguir vem a Quaresma...
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