Naquilo que se conhece, na atualidade, por tempos livres para elas
era tempo de “fazer renda”. Estavam sempre ocupadas, entre as tarefas
domésticas e algumas idas ao campo, o passatempo delas era fazerem o que as
mães lhes ensinaram e estas já tinham aprendido com as suas mães (avós) e por
aí fora e dentro (bisavós, trisavós, …) até tempos a que não se encontra o “fio
à meada”. Ora de fios e meadas sabiam elas na perfeição.
Em casa…
Entre a fresta da janela para terem luminosidade, em pontos
minuciosos quando a vista já as traía, no recato do lar caseiro, com algum gato
ensonado à perna, davam pontos e nós, manejando a agulha ou agulhas (dependia
do tipo de renda) com uma habilidade de ilusionista. Tinha particular gosto em
ver a minha avó paterna (Xá Marí Jaquina) fazer meias que dizia serem para mim, mas
de que eu desconfiava pois pareciam-me iguais às dos toureiros, mas em linha de algodão,
por isso brancas como a cor da cal: pureza, limpeza e com aquele cheiro -
quando em paredes caiadas de fresco - inconfundível. O que essas mulheres de
Montalvão tinham era serem como a cal, mesmo muitas já enlutadas com negro
carregado eram de uma habilidade e criatividade incomparáveis. Faziam
quilómetros de rendas e bordados de linho, como a minha Ti Jaquina.
Mulheres a fazer renda, num largo, em Velada (freguesia de São Matias, no concelho de Nisa) mas podia ser numa qualquer rua de Montalvão |
Juntas… mas cada uma por si
Ao final da tarde, em dias soalheiros juntavam-se, em pequenas
cadeiras empalhadas, numa fila de mulheres a fazer renda. Eram as andorinhas a
fazer ninho e alimentar os filhotes nos beirais dos telhados e elas junto à
barra ocre ou azul das casas a “matar o vício”: agulha para ali, dedo para
aqui, linha por cima, agulha para a esquerda, laçada para a direita, mais um nó para trás e um relevo para a frente. Uma
manufatura de renda ali bem passada, de uma quantas montalvanenses, a trocar
dois dedos de conversa e não se enganavam. Aliás era mais fácil enganarem-se na
conversa que trocarem os dedos na renda!
E assim passaram uma vida. Cuidar dos
maridos, dos filhos, da casa e da… renda. Renda de casa era renda de tecedeira,
transformando novelos em fio e fio em belas peças que ainda hoje são tão belas
quando a habilidade permite superar o impossível: transformar um fio num pano!
E olhar para ele dizendo:
Que mãos perfeitas e habilidade insuperável te fizeram
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