À procura da redenção de que «no Carnaval ninguém leva a mal» aproveitava-se o Entrudo para ajustar contas de um ano ou de uma vida. E nem sempre terminava tudo em bem. Até porque eram feitas de noite. Pela calada da noite para fugir à identificação.
As «Trinquetânédas» era aproveitar os trincos de polegar das fechaduras que alavancavam o fecho em régua pelo interior mas eram manipuladas do exterior para lhe atar um cordel com a dimensão em comprimento adequada para ficar suficientemente longe para fugir sem ser identificado mas perto para sortir efeito conseguindo que o trinco batesse forte para cima e para baixo fazendo um barulho incómodo de tão irritante. Assim que pressentiam que quem estava em casa viria a uma das janelas ou mesmo à porta (pelo ranger do soalho em noite silenciosa) logo tratavam de fugir. Não sendo descobertos estava feito o ajuste de contas. Para o mal ou para o bem. Neste caso se fosse entre amigos pois teria retribuição no próximo Entrudo. Também havia alguns que todos os anos tinham "visitas" dos catchôpos. Eram os que "afinavam" com a brincadeira. Quanto mais se irritavam mais eram frequentados pelo cordel e gaiatos. E sabiam disso. Mas a irritação sobrepunha-se à razão.
As «Caqueirédas» eram ainda mais violentas. Aproveitavam o facto das portas da rua nunca estarem fechadas à chave e quando, raramente, estavam tinham o postigo apenas encostado, mas dificilmente, trancado. A não ser numa ausência muito prolongada e para longe da aldeia. Chegava a noite, até a madrugada. Estando a família reunida "ao lume" ou mesmo já deitada escolhia-se a casa a "alvejar", abria-se o postigo (por vezes até a porta) e atirava-se para o chão lajeado objectos que causassem barulho - cacos velhos, latas, ponedros, etecetra - quebrando o silêncio da noite e bem-estar dos residentes. Depois ainda podia ser atirada («aventéda» em montalvanês) outra imundície, como detritos, estrume, lodo ou lama se houvesse pretexto para vingança feroz.
Por vezes a "partida de Carnaval" era tão violenta que se tratava mais de vingança a pretexto do Carnaval, usando-o com «escudo protetor» nos raros casos em que o(s) prevaricador(es) era(m) apanhado(s) que "brincadeira". É claro que quem era vítima, tentava desesperadamente apanhar quem fizera a "partida de Carnaval", gritando a plenos pulmões da porta de casa para a rua vasto reportório de insultos e pragas. Como geralmente "era tarde demais" para apanhar o "brincalhão", nada mais restava que ir lançando impropérios enquanto ia limpando o chão pensando em quem seria o "vândalo" enquanto listava os suspeitos, ou seja, os vizinhos e habitantes com quem tivera desavenças recentes.
Para "acabar" o Entrudo falta escrever acerca das imitações. As "entrudédas". Amanhã que é o dia delas.
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