OS
TERRATENENTES DE MONTALVÃO MARCARAM A VIDA E EVOLUÇÃO DO TERRITÓRIO.
A
Num território tão vasto, isolado e com pouca capacidade para utilização agrícola mas dependendo quase em exclusivo da agricultura, as famílias dos «riques», modelaram o espaço e as vidas dos montalvanenses. Pelos registos de casamento, no século XIX, cerca de 80 por cento dos homens eram jornaleiros ao serviço de escassos Proprietários e Lavradores.
(clicar em cima desta e de quase todas as imagens permite melhor visualização das mesmas)
Em 1758, aquando do inquérito para avaliar
os danos provocados em todo o País, pelo terramoto de 1 de novembro de 1755, aproveitando para conhecer a geografia, história e sociedade de cada paróquia, o
enorme território do concelho de Montalvão estava dividido em quatro folhas.
Provavelmente, ainda as mesmas aquando da formação do povoado, em final do
século XIII tendo em conta que as mudanças sóciopolíticas eram lentas,
mantendo-se a inércia e tradição durante séculos. Havendo mudanças, entre o
século XIII e o século XVIII elas seriam residuais.
Para a questão colocada no questionário elaborado na Corte em Lisboa, da responsabilidade de Sebastião José de Carvalho e Melo, futuro Marquês de Pombal:
O Pároco de Montalvão, Vigário Frei António Nunes Pestana de Mendonça, responde (texto inicial):
O médico psiquiatra Miguel Bombarda em 1907. Seria assassinado no seu gabinete no Hospital de Rilhafoles, atual Miguel Bombarda, destinado a deter alienados, indigentes e curar doentes mentais |
Os «riques» marcaram a sociedade montalvanense durante séculos
tendo, devido ao isolamento de Montalvão e ao poder que detinham no espaço, a capacidade para fazer funcionar a economia do território tal como as tradições e a
administração. Uma localidade com centenas de jornaleiros que eram empregados
dos terratenentes que dominavam o território montalvanense, lhes moldavam a
vida em trabalho, proporcionavam os dias festivos, geriam conflitos e
interesses, garantindo os rituais religiosos e proporcionando o desenvolvimento
do povoado. Os “resquícios das amarras feudais”, em Montalvão, chegaram até
meados do século XX. A população libertou-se da pobreza e servidão quando
emigrou para os países da Europa Central, América do Norte e Área Metropolitana
de Lisboa.
Os “Ricos” mantinham o domínio territorial em grandes
propriedades que o sistema de casamento entre estas famílias permitia
acautelar. Com o advento do Liberalismo no século XIX e com mais intensidade no
século XX, com a implantação da República, houve “libertação de terras” devido
à necessidade de pagar dívidas. Por vezes os “Ricos” deixavam escapar terrenos
agrícolas do seu controle ao cederem propriedades a filhos nascidos fora do
casamento, geralmente de criadas das suas casas senhoriais. É raro o ano em que
não há batismo de filhos de pais incógnitos, como este exemplo:
Nem todos filhos de pai incógnito, eram de criadas e de algum
membro de uma família para a qual serviam, como é evidente. Mas quando havia
nem sempre eram aperfilhados no batizado. Por vezes, quando eram mais
crescidos, pelo casamento e alguns nunca o foram. Dependia da vontade, sentido
de responsabilidade e circunstâncias do pai. A vida terá fundamentalmente de ser
entendida que a tomada de decisões tem sido sempre e continuará a ser em função
de muitas variáveis. Parafraseando o filósofo espanhol Ortega y Gasset
(1833/1955) o ser humano vive e decide conforme o meio que o rodeia e
condiciona. «O Homem é o resultado dele e a sua circunstância».
Quando o filho era do sexo masculino recebiam do pai (que sabia que era filho dele, aperfilhando-o ou não) terras e parelhas, poderia ser almocreve, para que não fosse jornaleiro e servo ao serviço de outra família de ricos que muitas vezes até eram familiares, tios e primos, pois as famílias de ricos alinhavam-se por meia dúzia de apelidos: Faria Leal, Fraústo, Morujo, Moura, Pimentel e Relvas, por exemplo. E casavam entre eles. Ter um filho a ser empregado de um primo ou tio, condenado à pobreza, fazia muitos “Ricos” darem bens aos seus filhos nascidos fora do casamento. Houve muita propriedade agrícola que foi “desanexada” dos bens das mais poderosas famílias montalvanenses por este motivo, retalhando algumas extensas “Tapadas”.
Como eram poucas famílias terratenentes e casavam entre eles é
evidente que mais geração, menos geração estariam condenados a desaparecer. Houve
alguns casamentos entre famílias ricas de Montalvão e da Salavessa, depois
também do Pé da Serra quando este Monte se transforma em Aldeia, sede de
freguesia. Até com famílias de Nisa, Castelo de Vide e outras localidades, mas
sempre exceções à regra até ao século XIX. Em meados do século XX o declínio da
generalidade das famílias poderosas de Montalvão é já inevitável, com a
agravante de convergir com alterações profundas nas técnicas agrárias (o modo
como se fazia agricultura) devido à falta de mão de obra e necessidade de
mecanizar a agricultura. As últimas gerações, a de final do século passado, na
generalidade (pois há e haverá sempre exceções) são incapazes de tomar decisões
para garantir a continuação (com sustentabilidade) das famílias ricas
tradicionais. Foi o seu fim. Como dizia o meu avô materno: «Não lhes auguro
nada de bom». E teve razão embora já não visse que tinha…
Uma das famílias mais interessantes de perceber como tudo, ou muito, se passou é a família Louro. Teve de tudo. O senhor António Louro, nascido no Pé da Serra numa das famílias mais ricas, casou em Montalvão e para Montalvão foi viver. Mas a sua avó materna era de Montalvão, casando com um filho de um Lavrador que teve uma filha que foi casar ao Pé da Serra com o pai do senhor António Louro, o senhor Francisco Louro.
O senhor António Louro é
figura grata em Montalvão – regressou à localidade da sua avó materna, em 1889
– e vai ser ele que em 1911 fará, o arrolamento dos bens do Clero existentes em
Montalvão, para fazer cumprir a "Lei de Separação do Estado das Igrejas" (20 de abril de 1911), após a
implantação da República, em 5 de outubro de 1910. Mas isso fica para um dia
destes. Quer enaltecer o senhor António Louro, quer publicar o impressionante
inventário de bens da Igreja que existia na Paróquia de Montalvão no início da
segunda década do século XX.
Assim se foi fazendo (e desfazendo) Montalvão
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